ARTIGO DE OPINIÃO
Conhecimento histórico e desenvolvimento de competências

FERNANDA OLIVAL | Diretora do CIDEHUS - Universidade de Évora

Pedir a alguém para ter uma componente curricular de História na sua formação estrutural tem múltiplos objetivos. Não se trata apenas de fazê-lo situar-se diante de uma série de marcos cronológicos, de eventos e de personagens do passado, que aumentam a sua cultura e a consciência de pertença neste mundo globalizado. É também isto, mas é muito mais.

Está em jogo desenvolver competências fulcrais do indivíduo do século XXI e prepará-lo para atuar e enfrentar os múltiplos e rápidos desafios do mundo em que vive. Ei-las: dimensão diacrónica/sincrónica/retrospectiva/prospectiva; dar espessura à compreensão do presente e ter consciência das implicações do passado; analisar em contexto, analisar complexidades e multi-causalidades em detrimento do raciocínio simplista e binário; ter noções de geografia histórica e de diversidade cultural; tomar consciência do problema do verdadeiro e do falso, da verosimilhança e da diversidade de interpretações e processos de construção destas; aprender a selecionar uma diversidade de fontes e conhecer os seus limites e incongruências; exercitar o raciocínio dedutivo e indutivo; valorizar a escrita ou o discurso como ato de mediação e o modo como se estrutura; desenvolver a análise conjuntural, micro-conjuntural e estrutural; tomar consciência das mudanças e das suas implicações; desenvolver a capacidade de relativizar, de aceitar o outro e o diferente; desenvolver diferentes tipos de memória; saber identificar, respeitar e usufruir o património cultural e ambiental. É uma lista longa e certamente não a esgotei.

Tudo isto é relevante venha aquela criança/jovem um dia a ser economista, pedreiro, químico ou escritor, ou o que quiser e puder ser.

Acresce a tudo isto que as sociedades do futuro terão provavelmente mais tempo livre, à medida que a transformação digital e a inteligência artificial avançam. Neste cenário próximo, terão vantagem os que tiverem maior plasticidade intelectual e maior bagagem cultural para apreciar o lazer, o legado pretérito e a cultura em geral. Simplesmente, terão maior e melhor capacidade de adaptação. Serão globalmente mais felizes.

Assim, varrer a História dos curricula ou reduzi-la a muito pouco é uma inconsciência. As disciplinas nucleares da formação dos indivíduos exigem tempo adequado. A História não é, neste contexto, uma exceção.

Published in 26.04.2019