ARTIGO DE OPINIÃO
O declínio da História na formação do cidadão

FERNANDO LUÍS GAMEIRO | Professor de História do Ensino Secundário, doutorado em História Contemporânea e investigador do CIDEHUS-UÉ

Escolhemos como objecto de estudo oito horários de professores de história, do 7º ao 12º ano de um dos quatro agrupamentos de escolas da cidade de Évora. Verificámos que as quatro turmas do Curso de Línguas e Humanidades, duas de 10º e duas de 11º ano, estão no projeto de autonomia e flexibilidade curricular que teve início no ano letivo transato. Os docentes terão que lecionar o mesmo programa que estava previsto para os seis tempos em apenas cinco tempos semanais, um processo que no próximo ano lectivo se estenderá ao 12º ano.

Comparando os horários do ano letivo de 2016-2017 com os atuais verificamos que foi retirado um tempo (de seis para cinco) letivo à disciplina de História A no 10º e no 11º ano de escolaridade.

Analisando os horários de professores que lecionam do 7º ao 12º ano verificamos que História, História A e História da Cultura e das Artes são as três disciplinas que os ocupam.

A disciplina da História da Cultura e das Artes mantem os seis tempos tanto no 10º como 11º ano. A sua pertença à área das Artes exime-a da perca de horas. A «nova» disciplina de Cidadania e Desenvolvimento, que surgiu no quadro do projeto de autonomia e flexibilidade curricular, compõe a sua carga horária a partir da redução de horas em disciplina da área das Ciências Humanas e Sociais, isto é, no caso em estudo, da disciplina de História A.

Para obviar a este «inconveniente» no início do ano letivo surgiu o documento «Aprendizagens essenciais» que de acordo com a Direção Geral da Educação «são documentos de orientação curricular base na planificação, realização e avaliação do ensino e da aprendizagem, conducentes ao desenvolvimento das competências inscritas no Perfil dos alunos à saída da escolaridade obrigatória». O documento parece sugerir uma gestão mais flexível do programa, presume-se que possa servir para obviar ao impacto provocado pela diminuição da carga horária. Pergunta-se que aprendizagens essenciais são estas se, até indicações em contrário, os conteúdos a serem examinados incidem sobre a totalidade do programa.

Quanto à disciplina de Cidadania e Desenvolvimento nenhum dos oito horários estudados a integra. Esta deveria estar incluída na área das Ciências Sociais e Humanas, mas, pelo menos por agora, o professor de história não faz parte dos recursos a empenhar no ensino de conteúdos que lhe são familiares.

Observando os horários do ensino básico verificamos que as duas horas semanais no 7º, 8º e 9º ano são manifestamente insuficientes para a formação do aluno. A disciplina de Ciências físico-químicas, por exemplo, conta com três horas semanais no 9º ano.

Considerando o todo nacional, acareando esta diminuição/exiguidade de horas com os resultados da avaliação externa da disciplina de História A nos três últimos anos, verificamos que no final do 12º ano a média nacional de História A (alunos internos) foi em 2018 de 9,5. A de Física e Química A foi de 10,6, diferenças que naturalmente remetem para o recrutamento dos alunos mas que, ainda assim, merecem reflexão sobretudo porque uma análise retrospectiva tende a evidenciar uma tendência para a perpetuação destes resultados.

Melhorar-se-ão os resultados com diminuição da carga horária? Será uma boa solução alterar a matriz dos exames nacionais introduzindo-lhe maior número de perguntas de escolha múltipla, ou outro tipo de questionários que pouco têm a ver com a essência da disciplina, mas que se traduzem em melhores resultados?

Não se devia indexar o recrutamento no Curso de Línguas e Humanidades do ensino secundário à exiguidade da carga horária da disciplina de história entre o 7º e o 9º ano altura em que se vão formando as vocações? Que trabalho de motivação para a disciplina pode um professor fazer com noventa minutos de aulas por semana com pré-adolescentes? Considerado o caráter estruturante da disciplina de história na formação integral do aluno que cidadãos queremos formar?

São estes alunos que, concluído o 12º ano constituem a base de recrutamento para o ensino superior, procurando cursos na área das Ciências Sociais e Humanas e outras. Cidadãos que se pretende sejam capazes de compreender o mundo atual e de nele assumirem uma postura interventiva.

 

Published in 03.04.2019